Um Brinde ao Serra Pelada

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Dia desses, visitando a Gomes de Matos, resolvi parar ali no Serra Pelada, bar e restaurante que existe, há pelo menos, uns 40 anos. Hoje o bar é administrado pelo Santiago, sujeito gente boa, receptivo, como é a característica do ambiente; simples e acolhedor. O lugar é particular, você sai do caos do trânsito, se desviando das pessoas que estão na correria do comércio, das ruas de circulação de mercadorias e entra no aconchego do bar onde não há calor que não seja suprimido pela cerveja gelada que o Santiago tem guardada nos freezers, inclusive, dou a dica, se estiver pela região e quiser dar uma desacelerada necessária, vá ao Serra Pelada, coma uma panelada, tome uma ampola gelada e volte pro batente, a gente fica até pensando melhor.

Como disse, o estabelecimento existe há mais de 40 anos, pertencia a um garimpeiro, porém, era seu irmão quem tomava conta do lugar. Há 32 anos o bar mudou de dono, parou na mão de seu José Ferreira que manteve a tradição servindo iguarias leves, como panelada, buchada, sarrabulho, carneiro cozido e demais acepipes da maior qualidade gastronômica. Mas o destino se encarrega de contar boas histórias e Santiago, que trabalhava com tecidos em uma loja da Gomes de Matos, conheceu Daniele, filha de seu José, dono do Serra Pelada e então o amor fez o resto. Como nem tudo são flores, depois do casamento, seu José teve uns problemas de saúde e Santiago resolveu ajudar, usou a lembrança de cliente e se pôs atrás do balcão, ajudando o sogro e a esposa a tocar esse arauto de resistência que o Serra Pelada!

São 14 anos atrás do balcão! Seu José se aposentou e deixou nas mãos de Santiago e Daniele a incumbência de tocar o restaurante, coisa que o casal vem fazendo com esmero “tudo que a gente faz é com carinho, não ficamos rico, mas conseguimos tocar a vida em frente e ir melhorando aos pouquinhos” conta, orgulhoso, Santiago, entre uma cerveja e outra. 22699282998_7ceaef93dd_o.jpgEsses personagens da vida real viram a cidade crescer ao redor do mundo deles; a Gomes de Matos foi duas mãos, comércios que abriram e fecharam, pessoas que circularam por ali, gente que nasceu, gente que morreu e aí a gente se pergunta; o que a cidade faz pra preservar as memórias?

Hoje, em frente ao Serra Pelada, foi construída uma estação de bicicletas, desse projeto da prefeitura. Uma iniciativa correta, mas que ela revela pequenos detalhes que mostram nosso desinteresse com a história. Além do relato chateado de Santiago, que reclama da falta de diálogo na construção da estação, que surgiu de um dia pro outro “rapaz um amigo me avisou, pelo telefone, que tinha uma surpresa na frente do restaurante, pensei no pior, mas quando vi era a estação de bicicletas, eu tava lá no domingo de manhã e a estação surgiu na segunda”. Fato é que além da ausência de diálogo, algo mais complexo tinha sido alijado do processo; a escolha do nome.

A estação chama-se Esplanada, em referência ao estabelecimento da poderosa família Otoch, que é também um dos pontos de referência da avenida, porém, não tem o tempo e a representatividade histórica e patrimonial que o Serra Pelada ostenta. São mais de 40 anos, muitos homens e mulheres passaram por ali, gente rica, pobre, assassinos, advogados, médicos, comerciantes, trambiqueiros, estudantes, artistas, políticos, donas de casa e toda a sorte de cidadãos que compõe a cidade. A estação devia chamar-se SERRA PELADA ao menos isso a cidade poderia, delicadamente, presentear, a ela mesma! É grave, muito mais grave do que parece, pensarmos o desenvolvimento apagando nossas memórias, isso nos transforma em sujeitos sem identidade. Vamos atentar para as delicadezas que nossa cidade tem. Vamos fazer nossa cidade crescer valorizando nossa história.

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